Vicente Machado da Silva Lima

Vicente Machado da Silva Lima, ou simplesmente Vicente Machado, como historicamente ficou conhecido, nasceu no dia 09 de agosto de 1860 na cidade de Castro, Paraná. Era o primeiro filho do segundo matrimônio do capitão José Machado da Silva Lima, nascido em 1822. Pelo lado paterno seus ascendentes são perfeitamente conhecidos até o início, no Brasil, do século XVII, com nomes todos do maior respeito. Pelo lado materno (sua mãe, tendo sido Ana Guilhermina Laynes Pinheiro, irmã da primeira esposa do capitão José Machado da silva Lima) era neto de Vicente Ferrer Pinheiro. Pelo lado paterno entra na história gloriosa do Paraná o seu parente, padre Chagas Lima, da fundação de Guarapuava, e na história da cidade de Curitiba, o padre Agostinho Lima, possuidor de uma grande chácara na parte norte da cidade, onde o Conselheiro Zacarias de Góes instalou o Centenário Municipal.


Provavelmente aprendeu primeiras letras em Castro, vindo completar seus estudos propedêuticos em Curitiba.

Disse a seu respeito João Cândido, que já nas escolas primárias se constituía chefe resoluto e persuasivo, dominando as reações colegiais.

Devorava livros escolares interpretando com facilidade os assuntos que estudava. Por isso teria vencido classes mais adiantadas nas estimulantes pugnas das sabatinas.

Entrou, em 1876, para a histórica Academia de Direito de São Paulo, onde seu conterrâneo, o conselheiro João da Silva Carrão deixara nome como professor, e, como alunos, muitos paranaenses ficaram famosos. Em 1881 recebia o grau de bacharel em direito. Como estudante foi o chefe das ruidosas agitações boêmias a que São Paulo assistia com certo desenfado. Deu rumo também a algumas das correntes liberais de sua época. Adotou com ousadia o abolicionismo radical e pelas proclamações liberais que compunha, deixava entrever desde cedo, mas com certa prudência, seu republicanismo.

Assim que se viu formado pensou em regressar e servir seu Torrão natal, então ainda Província.

Como promotor público da Capital foi que iniciou sua vida, porém já em 1882 era convidado pelo Dr. Brasílio Machado para Secretario do seu Governo.

Tendo se casado com Antônia Moreira Lima, filha de Constancia Alves e de Antônio Moreira Lima, decidiu aumentar os seus proventos materiais, redobrando seu trabalho e ensinando filosofia no Instituto Paranaense. O magistério lhe foi ao mesmo tempo alimentação intelectual e estímulo de grande proveito, deixando-lhe erudição sedimentada. Como surgissem vagas na magistratura, aceitou ser Juiz Municipal de Ponta Grossa (1883), onde, da mesma forma que em outros cargos ocupados, invariavelmente brilhava ao subir à tribuna. Abandonou logo, porém, a carreira de juiz, para, mesmo em Ponta Grossa, abrir banca de advogado e dar passos iniciais, mas firmes, como político.

Logo em 1884 jogou-se com afinco ao jornalismo, onde aprendeu a lidar em 1877, na Faculdade de Direito de São Paulo. Escreveu artigos políticos no “19 de Dezembro” e no “A Província do Paraná”.

Em 1886 decidiu-se finalmente a tentar a carreira política. Candidatou-se à Assembléia Provincial pelo Partido Liberal, de que era chefe incontestável Jesuíno Marcondes.

Foi por essa forma, pouco além da idade da emancipação, já líder indiscutível entre os jovens da sua geração e, sobretudo aqueles que podiam por seu próprio valor, constituir-se como elite, em pedestal à sua liderança.

Quando Jesuíno Marcondes viu-o entrosado no Partido Liberal não escondeu sua satisfação, declarando: “Eis aqui a esperança do partido”. Não tardou, porém, em desiludir os conservadores monarquistas, ao mostrar que seus objetivos não cifravam à manutenção da situação existente.

A 22 de agosto de 1888 punha como problema do partido a aspiração inadiável de completa descentralização, ao mesmo tempo administrativa e política das Províncias. Logo depois, na sessão de 23 de setembro afirmou publicamente suas convicções republicanas. Com isso fortaleceu a ação do diminuto grupo de republicanos concentrados em torno do semanário “A República” e do Clube Republicano. Em conferência pública, no Teatro S. Teodoro, explanou, larga e vibrantemente, os ideais dos novos tempos, sendo aclamadíssimo (R. Martins, Terra e Gente do Paraná). Em 1888 tentou a reeleição, desta vez pelo Partido Republicano, sem sucesso.

Depois de 15 de novembro de 1889 a tendência foi a sentir-se levado pelo torvelinho ascendente. Chefe da Polícia do Governo Provisório, logo foi, embora por muito pouco tempo, presidente da Câmara Municipal de Curitiba, daí passando a Superintendência da Instrução Pública do Estado.

O fato de haver Vicente Machado ocupado tão raro brilho tantas e tão variadas posições, mostrando em todas elas de forma inequívoca talento inexcedível e capacidade de trabalho assombrosa, constituiu eloqüente demonstração de que possuía qualidades intrínsecas de um líder verdadeiro. Essa foi razão pela qual o escolheram relator geral da Constituinte do Estado do Paraná, de 07 de abril de 1892, a segunda sob o novo regime.

Liderou a elaboração da Carta Constitucional Republicana, através de uma Comissão ainda integrada por Arthur de Abreu, Alencar Guimarães, Albino Silva e Victor do Amaral.

Como governador e constituinte, superintendeu o ensino, organizou a força pública e estruturou a justiça, deixando em todos esses departamentos da administração o cunho marcante da sua personalidade.

A 18 de abril de 1893, quando já no Sul as sombras revolucionárias escureciam os horizontes da Pátria, assumiu como vice-governador do Estado, a responsabilidade do governo, em face da licença concedida a Xavier da Silva, por um ano, para tratamento de saúde.

Invadido o Paraná, em dezembro, já havia multiplicado seus esforços para dar eficiência à defesa, conforme a moção votada pelo Poder Legislativo de 30 de novembro de 1893. Às portas do Estado, a revolução federalista ameaçava as instituições.

Não seria, porém, possível a defesa sem apoio eficaz e decidido do Comando do 5º Distrito Militar a cuja frente estava o gal. Pego Junior.

Transferiu a capital para Castro. Mesmo assim não lhe foi possível manter o governo legal, dados os precários meios de defesa. Deixou o Estado juntamente com o comandante do distrito a 18 de janeiro de 1894. O governo legal ficou suspenso desde essa data até 12 de abril daquele ano, data em que na cidade de Castro reassumiu o poder, transferindo-se para Curitiba a 05 de maio, quando, sem resistência, os revolucionários abandonavam o Estado.

Em mensagem ao Legislativo disse: “tudo fiz quanto estava ao meu alcance para livrar meu Estado da invasão, o que infelizmente não pude lograr, pelo desdobramento sinistro que aos acontecimentos imprimiu a fatalidade”. Quando no Senador disseram que havia abandonado seu posto declarou: “Eu não havia de ficar sereno na posição a que me alcançava o voto popular, quando não tinha elementos para garantir minha autoridade, nem suficiente força para fazê-la respeitar. Se permanecesse, o sacrifício teria sido inútil, quando à minha frente corria o comandante do Distrito, apavorado. Não havia de ser com duas ordenanças e um pequeno grupo de amigos fiéis, mas assim mesmo desarmados, que se poderia resistir à invasão. Procedi como devia...”.

Quinze dias depois de sua chegada a Curitiba, propalou-se a notícia dos fuzilamentos em Paranaguá e na Serra. Levantou-se torva acusação contra o governo local.

Vicente Machado publicou enérgico manifesto afastando de seus ombros a responsabilidade de qualquer participação, protestando contra atos do representante militar do governo federal e seus asseclas sanguinários.

“A excelência do regime republicano está em possuir natural remédio a todos os males. Meus patrícios que comungaram com a revolta podem estar tranqüilos quanto a perseguições e violências por parte das autoridades do Estado. Então só se sentirão dignificados pela aplicação da lei. Dos efeitos desta não devem temer quantos por si tiveram a justiça”.

Várias vezes, no Congresso do Estado (30 de maio de 1895) e ao Senado (outubro de 1897) tomou a palavra para explicar e defender-se das acusações que lhe foram feitas.

Foi notável quando respondeu ao Barão do Ladário, ex-ministro e último Secretario da Marinha do Império, ferido em 15 de novembro de 1889. Teve tal sinceridade em suas palavras que o Barão foi ao seu lugar apertar-lhe a mão, procedendo do mesmo modo o marechal Almeida Barreto.

Deixara o governo do Estado a 14 de junho de 1894 para fazer sua campanha eleitoral, candidato a Senador, que era. Pouco depois perdia sua primeira esposa. Apesar disso continuou sua luta e foi eleito, em janeiro de 1895, em substituição a Generoso Marques.

Grande lutador e realmente incrível. Não foi Senador mais cedo porque teve que esperar algum tempo até atingir a idade constitucional (35 anos) para enfrentar a Câmara Alta.

Em franca oposição a Prudente de Morais, que reagia contra os partidários do Marechal Floriano, seus concidadãos pasmaram ante a energia demonstrada em seu combate e o talento com que desenvolvia sua argumentação; tal predomínio exerceu no Senado onde outras figuras nacionais de incontestável valor pontificaram, seu patriotismo por tal modo ficou evidenciado, que Campos Sales, ao assumir a Suprema Magistratura do país, chamou-o para confiar-lhe a liderança da Câmara Alta.

Vicente Machado havia combatido a candidatura de Campos Sales, prestigiando a de Lauro Sodré. Campos Sales fizera pressão contra o chefe republicano paranaense através de Prudente de Morais, este havendo mandado um navio de guerra a Paranaguá para efeito psicológico, que, aliás, foi contraproducente. Com tudo isso a vitória de Vicente Machado e a sua brilhante oposição não deixaram o grande presidente paulista ressentido.

Já a esse tempo havia contraído novas núpcias com Helena Loyola, filha do coronel Joaquim Antonio de Loyola e de sua esposa Guilhermina Santos de Loyola.

Sem competidor, foi eleito presidente do Estado do Paraná em 1903, assumindo o poder a 25 de fevereiro de 1904, apesar da ameaça de dissidência no Partido Republicano.

É de sua autoria a lei de nº 449, equiparando os impostos de exportação de erva mate bruta aos da erva mate beneficiada. Levantou-se grande celeuma em torno dessa legislação, mas com o tempo se comprovou o acerto de medidas, embora o vozerio dos maldizentes. Numa das suas mensagens do Congresso Legislativo, declarou: “Não pode ser governo e nem abarca as responsabilidades da administração pública, quem se sentir esmagado pelo peso das suspeitas de que possa claudicar contra a honorabilidade administrativa, e que, pondo a mão na consciência, não possa vencê-las”.

Já a essa altura de sua vida sentia os terríveis efeitos da traiçoeira enfermidade que havia de prostrá-lo.

Ainda foi a Europa em1906 tentar remédios, mas provavelmente os recursos experimentados teriam diminuído sua resistência. Por lá ficou de abril a dezembro de 1906. Mas de volta estava condenado. Tinha apenas 46 anos e 7 meses, quando faleceu a 03 de março de 1907.

Biografia: História biográfica da república no Paraná, de David Carneiro e Túlio Vargas, 1994.
Foto: Galeria do Salão dos Governantes do Palácio Iguaçu, reproduzida pro Simone Fabiano.